Evangelho segundo São Mateus, 26
Jesus prediz a sua morte. Reunião do Sinédrio. Refeição de Betãnia. Judas vende Jesus. Jesus manda preparar a última ceia. Jesus indica o traidor. Instituição da Eucaristia. Saindo Jesus, prediz o abandono dos discípulos. Em Getsemani. Entrega e prisão de Jesus. Em casa de Caifás. Negação de Pedro.
VIDA DOLOROSA DE JESUS
Jesus prediz a sua morte.
[1] Aconteceu que, tendo Jesus acabado todos estes discursos, disse aos seus discípulos:
[2] "Vós sabeis que daqui a dois dias será celebrada a Páscoa, e o Filho do homem será entregue para ser crucificado." •
Reunião do Sinédrio.
[3] Então se reuniram os príncipes dos sacerdotes e os anciãos do povo no palácio do sumo pontífice, que se chamava Caifás, •
[4] e tiveram conselho acerca dos meios de prenderem a Jesus por astúcia, e de o matarem.
[5] Mas eles diziam: Não (se faça isto) no dia da festa, não suceda levantar-se algum tumulto entre o povo. •
Refeição de Betãnia.
[6] Estando Jesus em Betânia, em casa de Simão o leproso, •
[7] aproximou-se dele uma mulher com um vaso de alabastro, cheio de um bálsamo precioso, e o derramou sobre a cabeça dele, estando à mesa. •
[8] Vendo isto, os discípulos indignaram-se 1, dizendo: "Para que foi este desperdício? •
Indignaram-se. Nem todos os discípulos se indignaram, mas sòmente alguns, e, de um modo especial, Judas.
[9] Porque este bálsamo podia vender-se por bom preço, e dar-se aos pobres."
[10] Jesus, sabendo isto, disse-lhes: "Porque molestais esta mulher? Ela fez-me verdadeiramente uma boa obra. •
[11] Porque vós tereis sempre convosco pobres; mas a mim nem sempre me tereis. •
[12] Derramando ela este bálsamo sobre o meu corpo, fê-lo como para me sepultar. •
[13] Em verdade vos digo que em toda a parte onde for pregado este Evangelho — em todo o mundo—, publicar-se-á também para sua memória o que ela fez." •
Judas vende Jesus.
[14] Então um dos doze, que se chamava Judas Iscariotes, foi ter com os príncipes dos sacerdotes, •
[15] e disse-lhes: "Que me quereis vós dar, e eu vo-lo entregarei?" Justaram trinta moedas de prata 1. •
Trinta moedas de prata, o preço de um escravo.
[16] Desde então buscava oportunidade para o entregar.
Jesus manda preparar a última ceia.
[17] No primeiro dia dos ázimos aproximaram-se de Jesus os discípulos, dizendo: "Onde queres que te preparemos o que é preciso para comer a Páscoa?" •
[18] Jesus disse: "Ide à cidade, a casa de um tal, e dizei-Ihe: O Mestre manda dizer: O meu tempo está próximo, quero celebrar a Páscoa em tua casa com meus discípulos." •
[19] Os discípulos fizeram como Jesus tinha ordenado, e prepararam a Páscoa. •
Jesus indica o traidor.
[20] Chegada a tarde, pôs-se Jesus à mesa com os doze. •
[21] Enquanto comiam, disse-lhes: "Em verdade vos digo que um de vós me há-de entregar." •
[22] Eles, muito tristes, cada um começou a dizer: "Porventura sou eu, Senhor?" •
[23] Ele respondeu; "O que mete comigo a mão no prato esse me entregará. •
[24] O Filho do homem vai certamente, como está escrito dele, mas ai daquele homem, por quem será entregue o Filho do homem! Melhor fora a tal homem que não tivesse nascido." •
[25] Judas, o traidor, tomou a palavra e disse: "Sou eu, porventura, Mestre?" Jesus respondeu-lhe; "Tu o disseste." •
Instituição da Eucaristia.
[26] Enquanto comiam, Jesus tomou pão e o benzeu, e o partiu, e deu-o a seus discípulos, dizendo: "Tomai e comei, isto é o meu corpo." •
[27] Depois, tomando um cálice, deu graças, e deu-lho, dizendo: "Bebei dele todos. •
[28] Porque isto é o meu sangue, o sangue da nova aliança, que será derramado por muitos para remissão dos pecados. •
A antiga aliança tinha sido selada com sangue de animais sacrificados; a nova é selada com o sangue de Cristo (Hb. 9, 13).
[29] Digo-vos: desta hora em diante não beberei 1 mais deste fruto da videira até aquele dia, em que o beberei novo convosco no reino de meu Pai." •
Não beberei... Com estas palavras Jesus não se refere ao cálice consagrado, mas ao vinho comum, prometendo-lhes que no céu serão inebriados com abundância de consolações.
Saindo Jesus, prediz o abandono dos discípulos.
[30] Depois do canto dos salmos, saíram para o monte das Oliveiras. •
[31] Então Jesus disse-lhes: "A todos vós serei esta noite uma ocasião de escândalo porque está escrito (Zc. 13, 7): Ferirei o pastor, e as ovelhas do rebanho se dispersarão. •
[32] Porém, depois que eu ressuscitar, irei diante de vós para a Galielia." •
[33] Pedro respondeu-lhe: "Ainda que todos se escandalizem a teu respeito, eu nunca me escandalizarei." •
[34] Jesus disse-lhe: "Em verdade te digo que esta noite, antes que o galo cante, me negarás três vezes." •
[35] Pedro disse-lhe: "Ainda que eu tenha de morrer contigo, não te negarei." Do mesmo modo falaram todos os discípulos. •
Em Getsemani.
[36] Então foi Jesus com eles a um lugar chamado Getsemani 1, e disse-lhes: "Sentai-vos aqui, enquanto eu vou acolá orar." •
Getsemani, isto é, lagar de azeite. Era sem dúvida um pequeno campo plantado de oliveiras, com um rústico lagar de azeite, como havia e há alada muitos na Palestina (Lagrange).
[37] E, tendo tomado consigo Pedro e os dois filhos de Zebedeu, começou a entristecer-se e angustiar-se. •
[38] Disse-lhes então: "A minha alma está numa tristeza mortal; ficai aqui e vigiai comigo." •
[39] Adiantando-se um pouco, prostrou-se com o rosto em terra, e fez esta oração: "Meu Pai, se é possível, passe de mim este cálice! Todavia não se faça como eu quero, mas sim como tu queres." •
[40] Depois foi ter com seus discípulos, encontrou-os dormindo, e disse a Pedro: "Visto isso não pudeste vigiar uma hora comigo?
[41] Vigiai e orai, para que não entreis em tentação. O espírito na verdade está pronto, mas a carne é fraca." •
[42] Retirou-se de novo pela segunda vez e orou assim: "Meu Pai, se este cálice não pode passar sem que eu o beba, faça-se a tua vontade."
[43] Foi novamente, e encontrou-os dormindo, porque os seus olhos estavam pesados (por causa do sono).
[44] Deixando-os, foi de novo, e orou terceira vez, dizendo as mesmas palavras. •
[45] Depois foi ter novamente com os seus discípulos, e disse-lhes: "Dormi agora e descansai, eis que chegou a hora, em que o Filho do homem vai ser entregue nas mãos dos pecadores. •
[46] Levantai-vos, vamos. Eis que se aproxima o que me há-de entregar."
Entrega e prisão de Jesus.
[47] Estando ele ainda a falar, eis que chega Judas, um dos doze, e com ele uma grande multidão com espadas e varapaus, enviada pelos príncipes dos sacerdotes e pelos anciãos do povo. •
[48] O traidor tinha-lhes dado este sinal: "Aquele a quem eu der um ósculo, é esse; prendrei-o." •
[49] Aproximando-se logo de Jesus, disse: "Salve Mestre." E deu-lhe um ósculo. •
[50] Jesus disse-lhe: "Amigo, a que vieste !" Então avançaram, lançaram mão de Jesus, e prenderam-no.
[51] E eis que um dos que estavam com Jesus, estendendo a mão, desembainhou a sua espada, e, ferindo um servo do sumo pontífice, lhe cortou uma orelha. •
[52] Jesus disse-Ihe: "Mete a tua espada no seu lugar, porque todos os que tomarem espada 1 (por autoridade própria), morrerão à espada. •
Todos os que tomarem espada por autoridade própria, para exercerem vingança, merecem morrer à espada.
[53] Julgas porventura que eu não posso rogar a meu Pai, e que ele me não porá aqui logo mais de doze legiões de anjos? •
[54] Como, pois, se cumprirão as Escrituras segundo as quais assim deve suceder?" •
[55] Depois, Jesus disse à multidão: "Vós viestes armados de espadas e de varapaus para me prender, como se faz a um salteador. Todos os dias estava eu sentado entre vós ensinando no templo, e não me prendestes. •
[56] Mas tudo isto aconteceu para que se cumprissem as Escrituras dos profetas." Então todos os discípulos o abandonaram e fugiram. •
Em casa de Caifás.
[57] Os que tinham prendido Jesus Ievaram-no a casa de Caifás, sumo sacerdote, onde se tinham reunido os escribas e os anciãos. •
[58] Pedro seguia-o de longe, até ao átrio do príncipe dos sacerdotes. E, tendo entrado, sentou-se com os servos para ver o fim de tudo isto. •
[59] Entretanto os príncipes dos sacerdotes e todo o conselho procuravam algum falso testemunho contra Jesus, a fim de o entregarem à morte, •
[60] e não o encontravam, posto que se tivessem apresentado muitas testemunhas falsas. Por último, chegaram duas testemunhas, •
[61] que declararam: "Este homem disse: Posso destruir o templo de Deus e reedificá-lo em três dias." •
[62] Levantando-se, o príncipe dos sacerdotes disse-lhe: "Nada respondes ao que estes depõem contra ti?"
[63] Jesus, porém, estava calado. E o sumo sacerdote disse-lhe: "Eu te conjuro por Deus vivo que nos digas se tu és o Cristo, o Filho de Deus." •
[64] Jesus respondeu-lhe: "Tu o disseste. Digo-vos mais que vereis depois o Filho do homem sentado à direita do poder de Deus, e vir sobre as nuvens do céu." •
Jesus declara que é Deus e que será o juiz supremo de toda a humanidade.
[65] Então o sumo sacerdote rasgou os seus vestidos, dizendo: "Blasfemou; que necessidade temos de mais testemunhas? Eis acabais de ouvir a blasfêmia. •
[66] Que vos parece?" Eles responderam: "É réu de morte." •
[67] Então cuspiram-lhe no rosto, e feriram-no a punhadas. Outros deram-lhe bofetadas, •
[68] dizendo: "Profetiza, Cristo! Diz-nos quem é que te feriu."
Negação de Pedro.
[69] Entretanto Pedro estava sentado fora no átrio. Aproximou-se dele uma criada, dizendo : "Tu também estavas com Jesus, o Galileu." •
[70] Mas ele negou diante de todos, dizendo: "Não sei o que dizes."
[71] Saindo ele à porta, viu-o outra criada, e disse para os que ali se encontravam: "Este também andava com Jesus Nazareno." •
[72] Novamente ele negou com juramento, dizendo: "Não conheço tal homem."
[73] Pouco depois aproximaram-se de Pedro os que ali estavam, e disseram: "Tu certamente és também dos tais, porque até o teu modo de falar te dá a conhecer." •
[74] Então começou a fazer imprecações e a jurar que não conhecia tal homem. Imediatamente o galo cantou.
[75] Pedro lembrou-se da palavra que lhe tinha dito Jesus: "Antes de cantar o galo, três vezes me negarás." E, tendo saído para fora, chorou amargamente. •